Por Guilherme Fiuza
O
ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, é
uma figura muito importante para o Brasil. Os brasileiros gostam de sonhar com
a purificação de Dilma Rousseff, parindo teses quase diárias sobre a
independência da presidente em relação a Lula. Toda hora alguém descobre que
Dilma é diferente, que não transige com os métodos do padrinho, que não admite
os contrabandos éticos da ideologia companheira etc. Aí surge o ministro
intocável para despertar esse povo crédulo de seus doces delírios. Gilberto
Carvalho é a partícula de Deus do lulismo, a prova científica da matéria
lulista em Dilma.
E
quando o Brasil se esquece desse fato, o próprio Gilberto Carvalho se encarrega
de lembrá-lo. Tudo ia muito bem para o governo Dilma no julgamento do mensalão,
com a opinião pública olhando para os réus do valerioduto como se aquilo fosse
uma história de época, um filme de máfia sobre um passado que passou. Foi
quando surgiu a voz sensata de Carvalho para avisar: “Quem aposta no desgaste
do governo (com o julgamento do mensalão) vai se decepcionar!” Pronto. Ali
estava o bóson de Higgs do governo popular se entregando no inconfundível
estilo petista – fazendo o pênalti e depois levantando os braços para dizer
“não fui eu”.
Os
braços levantados do zagueiro Carvalho, com seus dez anos de palácio unificando
os gabinetes de Lula e Dilma, falam mais que mil palavras. Mas ele fez questão
de ser didático. Comparando a repercussão atual do julgamento com a do
escândalo em 2005, o ministro lembrou: no que “baixou a poeira do debate
político”, o povo apoiou “o processo”, reelegendo Lula em 2006 e elegendo Dilma
em 2010. Estava mais do que na hora de alguém gritar que “o processo” de Lula e
Dilma é o mesmo, inclusive na testada e aprovada capacidade de ganhar eleições
e manter a popularidade alta apesar das trampolinagens.
A
mensagem de Gilberto Carvalho ao país é muito rica, contendo alta carga
conceitual, mas pelo menos uma tradução bem simples pode ser feita: percam as
esperanças de nos desmascarar, porque o eleitorado não está nem aí para os
nossos esquemas parasitários.
O
brado do ministro da Secretaria-Geral da Presidência foi ouvido,
coincidentemente, depois da apresentação da defesa de José Dirceu no Supremo
Tribunal Federal. O advogado do ex-ministro e suposto chefe da quadrilha
lembrou que Dilma, quando ouvida no processo, proferiu um nada-consta sobre
Dirceu quanto ao seu tráfico de influência junto aos bancos do mensalão. Um
sutil gesto de solidariedade com o companheiro de armas que, no presente
momento, poderia soar comprometedor – se a platéia fizesse um pequeno esforço
para se lembrar que a venerável dama de ferro não veio de Marte.
Dilma
veio, precisamente, do planeta Dirceu. Sua ascensão à Casa Civil foi articulada
pelo próprio, no exato momento em que ele caía em desgraça com o estouro do
escândalo. Dilma é, portanto, filha do mensalão. E fez questão, em plena
cerimônia de posse, de mostrar lealdade ao antecessor que afundava com as
revelações sobre o valerioduto. Só a opinião pública consegue separar a
presidente do grupo que está sendo julgado no Supremo – separação que nem ela
mesma jamais fez.
Os
quase 80% que aprovam Dilma Rousseff de olhos fechados (e bem fechados) devem
considerar mera coincidência as companhias que a afilhada de Dirceu cultiva em
sua trajetória gerencial: Erenice Guerra, os consultores Antonio Palocci e
Fernando Pimentel (este ainda pendurado no governo graças à grande
gestora-amiga) e outros filhos do “processo” Lula-Dilma que ficaram pelo
caminho, como Orlando Silva, Carlos Lupi e grande elenco parasitário – todos
parentes políticos da grande família de mensaleiros e aloprados, com os quais a
presidente, Deus a livre, não tem nada a ver.
Quem
tiver dúvidas, preste atenção às palavras do ministro Gilberto Carvalho
encerrando o assunto: “A presidenta Dilma nos deu a orientação de seguirmos
trabalhando rigorosamente, seguindo nossa tarefa de governo, numa atitude
semelhante à que o presidente Lula já tomara em 2005.” Como se vê, o
“processo”, “esquema” ou como se queira chamar esse caso de polícia com
fantasia de revolução é exatamente o mesmo há dez anos. Marque o pênalti, seu
juiz.
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